O colorismo, uma forma de discriminação baseada na tonalidade da pele, é uma questão persistente dentro das comunidades negras. Recentemente, um episódio envolvendo as rappers Doechii e Ice Spice trouxe esse tema à tona, evidenciando como o preconceito relacionado à cor da pele ainda permeia as relações interpessoais e profissionais.
Em abril de 2024, mensagens de texto vazadas revelaram que Ice Spice referiu-se a Doechii como a “retinta escolhida” (no original, “chosen darkskin”), insinuando que Doechii não enfrentaria as mesmas dificuldades que outras mulheres negras de pele escura. Essa declaração desmerece as experiências de Doechii e minimiza as lutas enfrentadas por mulheres negras de pele mais escura na indústria musical e na sociedade em geral.
O colorismo tem raízes profundas no colonialismo e na escravidão. Durante esses períodos, indivíduos de pele mais clara frequentemente recebiam tratamento preferencial, enquanto aqueles de pele mais escura eram submetidos a condições mais severas. Essa hierarquia baseada na cor da pele foi perpetuada ao longo dos séculos, resultando em preconceitos internalizados dentro das próprias comunidades negras.
É crucial reconhecer que o colorismo não é apenas uma extensão do racismo, mas uma forma específica de discriminação que causa divisões internas. Para combater esse problema, é necessário promover um movimento anti-colorismo que:
• Eduque sobre as origens e os impactos do colorismo: Compreender como o colonialismo e a escravidão contribuíram para a hierarquização baseada na cor da pele é fundamental para desmantelar esses preconceitos.
• Incentive a valorização de todas as tonalidades de pele: Celebrar a diversidade dentro da comunidade negra ajuda a combater estereótipos e promove a inclusão.
• Promova diálogos abertos sobre experiências relacionadas ao colorismo: Criar espaços seguros para discussões honestas pode ajudar a curar feridas e construir solidariedade.
• Desafie narrativas que perpetuam o colorismo: Questionar e confrontar comentários ou atitudes que reforçam a discriminação baseada na cor da pele é essencial para efetuar mudanças.
O incidente entre Doechii e Ice Spice serve como um lembrete da necessidade contínua de abordar o colorismo de forma direta e proativa. Ao nos unirmos contra essa forma de discriminação, podemos trabalhar para construir uma comunidade mais unida e equitativa, onde todas as tonalidades de pele sejam reconhecidas e valorizadas.
DANIYYEL DE JESUS
O racismo não se limita apenas a atos explícitos de discriminação, como insultos ou agressões físicas. Muitas vezes, ele se disfarça em atitudes e práticas inconscientes que têm sido naturalizadas ao longo do tempo, perpetuando estereótipos e mitos sobre pessoas negras e outras minorias. Esses comportamentos, muitas vezes considerados “normais” ou “inofensivos” por uma grande parte da sociedade, são formas sutis de racismo que precisam ser reconhecidas e desconstruídas para que possamos, de fato, erradicar a discriminação racial.
A desconstrução de estereótipos raciais é um passo essencial para promover uma sociedade mais justa e igualitária. Estereótipos como o de que pessoas negras são, por natureza, mais agressivas, menos inteligentes ou menos capacitadas são narrativas falaciosas que têm sido alimentadas por séculos e que, ainda hoje, influenciam a maneira como as pessoas negras são vistas e tratadas, tanto em ambientes profissionais quanto sociais.
Muitos desses estereótipos vêm carregados de uma carga histórica que remonta ao período colonial e à escravidão, onde as populações negras foram sistematicamente desumanizadas e forçadas a ocupar papéis subordinados. Mesmo após a abolição da escravidão, essas ideias continuaram a ser transmitidas, muitas vezes de maneira inconsciente, por gerações. Isso contribui para a perpetuação de desigualdades raciais, que se refletem nas oportunidades de educação, trabalho e acesso a serviços essenciais.
No entanto, é fundamental que cada um de nós se envolva ativamente nesse processo de desconstrução. Precisamos questionar nossas próprias atitudes e questionar os estereótipos que nos são apresentados pela mídia, pelas instituições educacionais e até mesmo dentro de nossas próprias famílias e comunidades. A educação e o autoconsciência desempenham papéis vitais nesse processo.
A desconstrução desses estereótipos também passa pela rejeição dos mitos racistas que ainda circulam em algumas esferas da sociedade. Mitos como o “racismo reverso” ou a ideia de que pessoas negras são responsáveis pelas desigualdades que enfrentam são argumentos vazios que buscam minimizar a gravidade do racismo e descreditar as lutas por igualdade racial. A realidade é que o racismo estrutural está presente em instituições como a justiça, a educação e o mercado de trabalho, e a luta contra ele deve ser reconhecida como uma questão de justiça social, não uma questão de “vítimas e vilões”.
É importante enfatizar que o racismo não é uma característica exclusiva de indivíduos com intenções maliciosas, mas sim um problema estrutural que afeta todas as esferas da sociedade. A conscientização sobre o racismo inconsciente e as práticas discriminatórias normalizadas deve ser parte do esforço coletivo para criar ambientes mais inclusivos e menos preconceituosos. Isso inclui revisar e modificar políticas institucionais, combater a exclusão social e, acima de tudo, promover um diálogo aberto e honesto sobre as experiências vividas por pessoas negras.
Erradicar o racismo é uma tarefa contínua e desafiadora, mas a desconstrução de estereótipos e mitos é um passo crucial. Ao educarmos a sociedade, não apenas sobre as formas mais evidentes de racismo, mas também sobre os comportamentos sutis e inconscientes, podemos começar a criar uma mudança real e duradoura. A luta contra o racismo é de todos, e a construção de um futuro mais igualitário depende da nossa capacidade de questionar, aprender e, acima de tudo, agir.
DANIYYEL DE JESUS
A escravidão pode ter acabado no papel, mas as suas marcas ainda permanecem vivas na alma do povo africano. Durante séculos, nossos antepassados foram arrancados das suas terras, brutalizados, desumanizados e tratados como mercadorias. Muitos morreram sem terem a chance de lutar pela sua liberdade, deixando para trás uma herança de dor e sofrimento. Suas almas, atribuladas pela injustiça, ainda ecoam através das gerações, e esse passado sombrio reflete-se na forma como muitos negros veem a si mesmos até hoje.
O colonialismo e a escravatura não apenas exploraram fisicamente o povo africano, mas também deixaram uma ferida profunda na identidade negra. Fomos ensinados a acreditar que éramos inferiores, que nossas culturas eram atrasadas, que nossos traços, nossos cabelos, nossas línguas e nossas crenças eram algo a ser apagado ou modificado para se encaixar em um padrão imposto. Esse processo gerou uma espécie de prisão mental que, até os dias de hoje, ainda mantém muitos de nós acorrentados.
E essa escravidão da mente é talvez a mais difícil de quebrar. Pois não se trata apenas do preconceito que vem de fora, mas também do preconceito que foi plantado dentro de nós. Muitas pessoas negras carregam sentimentos de autodepreciação, sentem que não são boas o suficiente, que precisam provar constantemente seu valor. Outras, por revolta, alimentam um ódio que as impede de encontrar paz.
Mas a verdadeira libertação não virá dos outros. Ela precisa começar dentro de nós. Para quebrar as correntes que ainda nos prendem, precisamos resgatar o orgulho da nossa história, reconectar-nos com a força dos nossos ancestrais e entender que a nossa identidade não é definida por um passado de opressão, mas por uma herança de resistência.
A libertação da mente negra é um processo de cura. É olhar-se no espelho e enxergar beleza na própria pele, é falar a própria língua com orgulho, é respeitar a própria cultura sem medo do julgamento. É entender que a revolta pode ser transformada em força, e que o conhecimento da nossa verdadeira história é a chave para quebrar qualquer corrente invisível que ainda nos prende.
A luta contra o racismo não é só externa. Ela começa dentro de cada um de nós. Só quando nos libertarmos internamente poderemos, de fato, viver a plenitude da nossa existência como povo.
DANIYYEL DE JESUS